quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

O que importa é a beleza interior

Sei que vou me arrepender disso quando tiver que escrever a coluna de culinária da semana que vem e não conseguir pensar em nada mais criativo que pão com manteiga, mas hoje estou com uma vontade danada de falar em comida. Acho que foi o post do Gastón, que prefere ver o cão chupando manga a ver um prato de sopa pela frente que me inspirou.

Falemos, pois de Caldo Verde, uma sopa tão boa quanto feia. É. Feia. De doer. Mesmo cortando a couve com a espada samurai que a Uma Thurman usa em Kill Bill, mesmo usando as folhas quase cruas, mesmo segmentando o paio com precisão cirúrgica; não tem jeito. Depois de pronto, um bom caldo verde fica com a mesma aparência daqueles fossos de castelos medievais: meio ocre, com uma espécie de pântano no fundo – o pântano é a couve, que vai parar lá embaixo – e umas rodelas suspeitas boiando. Toda vez que fico diante de um bom prato de caldo verde, começo com cuidado, temendo o momento que um monstro como o do Lago Ness vai se precipitar para fora do prato, pular na minha cara e sugar os meus olhos. E tem mais: se ficar bonito, das duas uma: ou a foto foi produzida ou o caldo verde não presta.
Se mesmo assim e com tudo isso, você ficou com vontade de provar, feche os olhos e vá fundo porque vale cada colherada.
Originalmente, o caldo verde é uma sopa típica do norte de Portugal, feita com couve e lingüiça defumada (lingüiça portuguesa, naturalmente), mas eu já fiz com paio e deu incrivelmente certo. Fica feio e delicioso do mesmo jeito.
Vamos a ele.
500g de batatas, descascadas cruas
300g de lingüiça portuguesa ou paio
1 ¼ l de caldo de carne
1 cebola
150g de couve, cortada em tiras da espessura de um fio de cabelo
Sal e pimenta-do-reino, a gosto
Primeiro a couve. É o seguinte: você pode querer comprar aquele grande maço de folhas de couve que dá pra forrar o telhado de um barraco e, com uma gilete, à moda de “Os Bons Companheiros”, passar a tarde cortando. Também pode jogar tudo no multiprocessador e deixar a lâmina tipo cimitarra cortar tudo, o que vai deixar o seu caldo verde ainda mais feio (se é que isso é possível). Uma terceira opção – talvez a mais eficaz – é pedir para a sua aia mineira fazer o trabalho. Não esqueça de remunerá-la regiamente, à parte. Agora, se você não tem uma aia mineira com paciência oriental, faça como eu e compre bandejas de couve previamente picada no supermercado. Novamente, os puristas saltarão dizendo que couve previamente picada oxida mais depressa, que a gente não sabe quem cortou, com que faca, se lavou antes... eu nem ligo. E estou vivinha até hoje.
Voltando à receita, coloque o caldo de carne em uma panela média e leve ao fogo alto até ferver. Claro que se você tiver um diploma Le Cordon Bleu e todo o tempo do mundo, pode fazer seu próprio caldo de carne, cozinhando um bouquet garni e ossos de vitela por seis ou oito horas em fogo baixíssimo. Caso contrário, use cubinhos de caldo mesmo, que você não há de ir para o inferno por causa disso.
Descasque as batatas e a cebola e corte em pedaços. Coloque-as dentro do caldo de carne fervente, baixe o fogo e cozinhe por 20 minutos, ou até que as batatas e a cebola estejam macias.
A couve já está cortada, né? Ótimo.
Tire as batatas e as cebolas do fogo e liquidifique por 1 minuto ou até ficar homogêneo. Volte o creme batido para a panela e leve ao fogo baixo para cozinhar por mais cinco minutos.
Tire a pele dos paios ou das lingüiças e corte em rodelas. Em outra panela, coloque água suficiente para cobrir as lingüiças e ferva por cinco minutos. As lingüiças já são defumadas, é fato, de forma que, teoricamente, nem seria preciso cozinhá-las. Só que se você for minimamente observador, já deve ter reparado que essas carnes salgadas de feijoada são justamente aquelas que ficam expostas e descobertas nos mercados, com moscas e outros bichos voando em cima. Isso, sem mencionar todo mundo que se aproxima para comprar e fica cutucando as pobres lingüiças com a mão. Eca! Eu fervo as minhas e, se for sua convidada para um caldo verde um dia, espero sinceramente que você também ferva as suas, nem que seja só por higiene. Como benefício adicional, considere que as lingüiças perderão um pouco da gordura com a fervura, seu caldo ficará mais leve e um pouco – pouco – menos parecido com um manguezal.
Tire as lingüiças da água e acrescente ao creme de batatas. Grite para que seus convidados se sentem. Se esfriar, o caldo fica ainda mais feio e nem um fanático conseguirá comê-lo. Finalmente, adicione a couve e deixe cozinhar por 2 minutos para ela não perder a cor. Ajuste os temperos (sal e pimenta). Retire o caldo do fogo e coloque numa sopeira aquecida. Voe para a mesa e sirva. Depois você me conta.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Lipo Solidária


_ Mamãe, eu acho que descobri uma solução para um dos maiores problemas de saúde pública do mundo!
_ Minha filha! Será mesmo? Que coisa incrível!
_ É. Vou te contar...
_ Não, boba. Não conta, não. Vamos escrever um artigo para uma revista científica de renome mundial e correr o risco de ganhar um Prêmio Nobel. Você sabe quanto pagam aos vencedores dos Prêmios Nobel? E o reconhecimento então..
_ Mamãe, escuta: chama-se lipo solidária e funciona assim: você pega uma pessoa gorda, extrai o excesso de gordura dela e armazena. Aí, pega uma pessoa muito magra, desnutrida e transplanta a gordura. Não seria incrível? Imagina todas aquelas pessoas passando fome na África? E a obesidade nos Estados Unidos? Seria coisa do passado!
_ Preciso pensar sobre isso, filha. Porque simplesmente transplantar gordura para uma pessoa magra não a tornaria saudável...
_ Mas aumentaria a sobrevida dela, não? O corpo dela poderia consumir o excesso de gordura enquanto não houvesse calorias suficientes!
_ É...
_ E os obesos viveriam muito mais felizes!
_ É...
_ Não é genial, mamãe?
_ É, filha. Genial. O que você quer fazer mesmo?
_ Direito.
_ Repense. De repente, você na medicina pode nos tornar ricas. E magras!

sexta-feira, 2 de março de 2012

Gosto é gosto


_ Mamãe, por que você não faz como todo mundo e pinta as unhas de verde?
_ Porque verde não é cor de unha, meu filho!
_ E vermelho é?

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Rede Social

_ E aí, milha filha, como foi o passeio com o seu namorado?

_ Eu não estou namorando, mamãe.

_ Como não?! Você sai com esse menino toda semana, já foi ao shopping, ao cinema, já beijou e não está namorando?!

_ Não.

_ E quando vai estar?

_ Quando ele pedir.

_ Pedir o quê, filha?

_ Minha mão em namoro.

_ Credo! Ainda tem isso? Isso era coisa do meu tempo...

_ Tem uma outra forma também.

_ E qual é?

_ Quando ele mudar o relationship status dele no Facebook.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Férias, parte 1


_ Mamãe, posso fazer uma fogueira no quarto?
_ É claro que não, filho.
_ E uma montanha com areia do parquinho para eu escalar?
_ No parquinho?
_ Não, né? No quarto.
_ Ah. Não pode.
_ Droga! Você não deixa nada.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Dieta Milagrosa da Pensatriz – parte II

Quer perder 5Kg 7Kg em duas semanas um mês?

Pergunte-me como.


Dói um pouco, mas é infalível.

Incline a cabeça para trás e abra bem a boca.

Enfie a mão e vá tateando para baixo até encontrar o coração.

Costuma ser um órgão quente que fica mais para o lado esquerdo, pulsando.

Gire no sentido horário até soltar e puxe com cuidado para cima.

Só com isso, você já perde 250g, se for mulher ou 300g, se for homem.


Agora falta pouco.

Ponha o coração em um prato até parar de pulsar. Não deve demorar muito.

Corte em pedaços pequenos e vá consumindo aos poucos, três vezes ao dia ou sempre que sentir necessidade.

Não tem erro.

Dieta Milagrosa da Pensatriz – parte I

Outro dia ouvi duas mulheres dizerem:

_ Nossa! Olha que magra! Só pode ser infeliz!

É evidente que não estavam falando de mim, mas fiquei com sentimentos ambíguos. Primeiro, porque detesto generalizações. Acho que toda generalização é burra, inclusive esta. Somos variados demais, diversos demais, múltiplos demais para cabermos em rótulos. Assim, da mesma forma que nem todo gordinho é simpático, nem todo baixinho é invocado e nem todo míope é inteligente (dentre outras generalizações que eu nem ouso citar), acho uma injustiça dizer que toda magra é infeliz.

Uma pessoa pode ser magra porque é geneticamente propensa e não porque nunca comeu uma bomba de chocolate na vida. Pode ser magra porque tem pais magros, porque tem intolerância a glúten, porque é vegan roxa, porque é diabética ou porque realmente não gosta de comer.

Mas de alguma forma aquilo me tocou e fiquei pensando. Será? As pessoas reagem de tantas formas diferentes a um mesmo estímulo.... Conheço várias que quando ficam tristes, comem compulsivamente. Comem um bolo inteiro, uma caixa de chocolates inteira, uma garrafa inteira de vodca...

Por outro lado – e muito cuidado aqui com as generalizações – é fato que essas moças magérrimas, de 1,80m e 50Kg não parecem lá muito felizes.

Será?

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Consequências

_ Mamãe, posso não ir à escola hoje?

_ Justo hoje?! Segunda-feira? Por que, filho?

_ Porque eu estou com uma dor de cabeça horrível.

_ Nossa! Que chato. E por que será?

_ Não sei. Acho que é ressaca mesmo.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Papo de outro mundo

_ Mamãe, o que é dimensão paralela?
_ Xi, filho! Como é que eu vou te explicar? Isso é um conceito tão abstrato...
_ O que é abstrato?
_ É uma coisa que não é palpável.
_ O que é não palpável?
_ Uma coisa não palpável é uma coisa conceitual.
_ O que é conceitual?
_ Caramba, Pedro. Conceitual é algo que não é concreto.
_ Saco.
_ Saco?!
_ É. Antes eu não sabia uma coisa. Agora, eu não sei quatro. Você só me confunde, mamãe!


terça-feira, 26 de abril de 2011

Fila

_ Mamãe, estou arrasado.

_ Que triste, meu filho. Por quê?

_ Porque tem dezenas de pessoas com quem a Lívia quer namorar antes de namorar comigo.

_ É mesmo? Tipo quem?

_ O Justin Bieber, os três Jonas Brothers, o Cauã Reymond...

_ Calma, meu filho. A Lívia não tem a menor chance com eles.

_ Mas ela é linda!

_ É linda para você, que está apaixonado. Para eles, ela nem existe. E mesmo que existisse, seria uma pirralha magrela boboca e sem graça.

_ Ela não é boboca!

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Fertilidade

_ Nossa, filho! Quantos ovos! Essa Páscoa rendeu, hein?

_ É, mamãe. Foi uma Páscoa bem ovípara.


terça-feira, 12 de abril de 2011

Romântico

_ Mamãe, eu posso me casar?

_ Claro que pode, filho.

_ Posso me casar agora?

_ Eu acho um pouco cedo. Você só tem nove anos. Vamos esperar mais uns 20, que tal?

_ Mas, e se eu estiver apaixonado?

_ Nem sempre que as pessoas se apaixonam, elas se casam, filho.

_ Não?!

_ Não.

_ Que horror.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Via Crucis

_ Mamãe, você sabia que antigamente as pessoas morriam crucificadas?

_ Sei, sim, filho. E era uma morte horrível. Às vezes, demorava horas porque as pessoas apanhavam muito antes e acabavam morrendo asfixiadas porque não conseguiam respirar naquela posição.

_ Nossa!

_ É. “Nossa” mesmo. Aliás, você sabe que Jesus Cristo morreu assim, não sabe?

_ Sei. Você estava lá?

_ É claro que não, filho! Francamente...

_ Ah, é. Desculpa, mãe. Esqueci que você não gosta de violência. Você ficou em casa, né?


quarta-feira, 6 de abril de 2011

Morte violenta

_ Mãe, tô satisfeito.

_ Ah, não, filho. Você não comeu nada. Come mais um pouquinho...

_ Não quero, obrigado.

_ Coitadinho do brocolezinho, que vai ficar sozinho no prato enquanto toooodos os outros brocolezinhos foram pra barriga...

_ Sorte do que ficou no prato, mamãe.

_ Por quê, filho?

_ Porque os outros caíram no ácido. Ácido estomacal. E estão sendo corroídos agora mesmo, dentro da minha barriga.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Um lugar...


_ Mamãe, a gente pode morar no fim de semana?
_ Como assim, filho?
_ O fim de semana é o meu lugar preferido no mundo. A gente faz um monte de coisa legal, fica junto... Eu queria morar no fim de semana. Definitivamente.

Pensando bem, eu também.

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Tendência


_ Ah, eu quero me casar na praia...
_ É mesmo, filha? Que romântico.
_ É, mamãe. Na praia, no fim da tarde, todo mundo descalço...

_ Eu também quero um casamento romântico!
_ É mesmo, filho? E como será o seu casamento?
_ Num vulcão.

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Meteorologia

_ Mamãe?

_ Oi, filho.

_ Podemos conversar sobre alguma coisa?

_ Claro. Sobre o que você quer conversar?

_ Podemos conversar sobre o tempo?

_ Podemos, sim.

_ Então, no tempo dos dinossauros...

_ Que tal a gente falar de algo mais comum sobre o tempo, filho?

_ Tá. Se eu pudesse voltar no tempo...

quarta-feira, 19 de maio de 2010

A mãe do Ian

Todo mundo tem mãe.

Tem mãe que é separada do pai e cria o filho sozinha; mãe que é separada e quem cria é o pai; mãe que mora em outra cidade e o filho é criado pela tia ou pela avó. Tem mãe que é brava, mãe que é legal e até mãe que de vez em quando a gente tem vontade de trocar por outra. Até a Marina tem mãe, só que a dela morreu. Tem também mãe que não tem filho, mas que cria o filho dos outros como se fosse seu e vira mãe de verdade. Todo mundo tem mãe porque todo filho nasce de uma barriga e a barriga só pode ser da mãe.

Todo mundo tem mãe, menos o Ian.


_ Por que você diz que o Ian não tem mãe, filho?

_ Porque ele não tem mesmo, mamãe. Foi ele quem disse!

_ Mas, filho, isso não pode ser. Como o Ian nasceu se não tem mãe?

_ Não sei, mas ele disse que não tem.

_ E por que ele diz isso?

_ Porque a mãe dele tem cabelo roxo.

_ Ah, então ele TEM mãe!

_ Tem, mas ele diz que não tem porque o cabelo dela é roxo.

_ Ah, filho, que injustiça! Não é porque ela tem o cabelo roxo, que deixa de ser mãe dele. Como o Ian é careta... Aliás, aposto até que o cabelo dela nem deve ser tãããão roxo assim. Deve ser um castanho escuro com reflexos acobreados e o Ian que é implicante.

_ Não é, mamãe. Você vai ver na reunião. Coitadinho do Ian...


Fui à reunião e, lá pelas tantas, entrou uma mulher de trinta e poucos anos e cabelos roxos. Roxo intenso. Longos fios cor de beterraba descendo até os ombros. Fiquei ali, olhando e pensando se ela sabia do efeito que aquilo provocava em um menino de oito anos.

Sei que a mãe do Ian não lê esse blog e respeito demais a individualidade humana para me meter num ninho de pulgas desses, mas se você, leitora, tem cabelos roxos ou de qualquer outra cor que não exista na natureza & um filho de oito anos, reconsidere.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

O fim do mundo

Meu filho está preocupado com o fim do mundo. Genuinamente preocupado.

Todas as noites, quando chego em casa, ele me bombardeia com perguntas sobre chuvas ácidas, cataclismas e asteróides de altíssimo poder de destruição. Hoje, estava particularmente tenso com o buraco na camada de ozônio.
Mal sabe ele que não há com o que se preocupar.
Afinal, o mundo já acabou. E não é de hoje.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Força de expressão

_ Boa noite, meu filho!

_ E aí?

_ Tudo bem com você? Vem cá me dar um beijo. Como foi na escola, e na natação, e no karatê?

_ Ah, véi, foi tudo bem; eu aprendi a virada olímpica e um golpe novo que...

_ Peraí! Momentin! O que foi que você disse, Montanha?

_ Que aprendi a virada olímpica e um golpe...

_ Não! Antes disso.

_ Antes eu disse que “tudo bem”.

_ Filho, do que foi que você me chamou?

_ Acho que de mamãe. Sei lá, cara!

_ Olha aí! Você fez de novo!

_ Fez o que, véi?

_ De novo, de novo! Estou tendo alucinações ou você está me chamando de “véi” e de “cara”?

_ Ah, é só força de expressão...

_ Pois póparar com essa “força de expressão”.

_ Mas todo mundo fala assim, véi!

_ Aaaaaaiii, Pedro! Para com isso agora mesmo! E para sempre, entendido? Mesmo que TODO MUNDO fale assim, você não falará. Não nesta vida. Não enquanto eu for sua mãe, entendeu?

_ Mas, mãe...

_ Mamãe, filho. Ou Dona Mamãe, se você preferir. Humpf! Era só o que me faltava.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Material escolar

Sabe quando tem revista no presídio e a polícia apreende 50 celulares, 5 punhais, 18 facas de cozinha e 32 granadas domésticas?

Foi como eu me senti hoje cedo, filho, na reunião com a sua professora, quando ela começou a enfileirar os itens apreendidos de você nas últimas semanas.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Unplugged

Trim, trim, triiiiiiiim!

_ Alô?

_ Mamãe?

_ Oi, filho.

_ Posso, só hoje, só hoje, ligar o Wii antes das quatro da tarde?

_ Não.

_ Não mesmo?

_ Não.

_ Mas eu já acabei a lição.

_ Ok. Mas a gente já combinou que até as quatro você fica fora da tomada. Vá brincar de outra coisa.

_ Ok.

(20 minutos depois)

Trim, trim, triiiiiiiim!

_ Alô?

_ Mamãe?

_ Fala, filho..

_ Tô ligando só para que você saiba que eu estou sofrendo muito.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Decisões


_ Mamãe, eu tomei uma decisão.
_ Ai, filho, estou com um mau pressentimento. Que decisão foi essa?
_ Resolvi que, definitivamente, eu vou parar de estudar.
_ Hmmm... acho que essa decisão não cabe a você, filho.
_ Por quê?
_ Porque você só tem oito anos e por mais uns quinze vai ter que estudar, quer queira, quer não.
_ Vou?
_ Vai.
_ Mas... e se eu quiser ser astronauta?
_ Bem, astronautas têm que estudar muita física, química, astronomia, geometria, matemática e biologia.
_ Credo! E se eu quiser ser explorador, arqueólogo?
_ Exploradores e arqueólogos precisam ser craques em história e biologia.
_ Um bombeiro, talvez...
_ Bombeiros têm que conhecer anatomia, dominar primeiros socorros e atendimento de emergência e saber um bom tanto de física e química também.
_ Já sei! Vou ser artista.
_ Artistas têm que saber história, matemática e geometria para entender de proporções e perspectiva e alguma química para misturar materiais.
_ Saco!
_ É. Eu imagino que seja. De qualquer modo, acho que você entendeu que tem que estudar, né?
_ Entendi.
...
_ Mamãe... e se eu quiser ser príncipe?
_ Bem, filho, nesse caso, você vai ter que estudar tudo isso e muito mais para conquistar uma princesa.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

O seu coração

E quis o destino que depois de uma longa pausa, meu coração reencontrasse o seu. E fomos, aos pouquinhos, redescobrindo o sentido de tudo, a graça de tudo, a beleza de tudo. Descobrimos que Deus, esse gozador, tinha planejado as coisas desde o início; inclusive a nossa separação.

E não é que esse mesmo Deus, brincalhão, colou meu coração no seu com Super Bonder celeste e quando ele estava bem colado, fez o seu coração entupir?

E de repente, sem maiores avisos, ali estava o seu coração na mesa do centro cirúrgico e o meu na boca, de nervoso, tendo que deixar aquele povo de branco picar, espetar, furar, cutucar você de tudo quanto é jeito.

Sete dias, meu amor. Uma semana inteira em que o seu coração bateu em primeiro plano e o meu bateu apertado, morto de medo. Fiz a única coisa que poderia fazer: suspendi tudo e fui ficar perto do seu coração. Afinal, onde mais o meu poderia estar?

E agora que essa taquicardia emocional passou, só nos resta cuidar com todo carinho de você e esperar seu coração cicatrizar. E ele vai, meu amor. Vai porque não há lugar mais amplo, macio e quente que esse músculo que bate dentro do seu peito. Vai porque a gente tem muito o que viver junto. E vai, principalmente, porque sem o seu coração, o meu não tem mais como ser feliz.

Deus te guarde.

De repente

Eu passei por aqui quase sem querer e me deu uma saudade danada de mim.

Deve estar na hora de me visitar. Será que eu lembro meus caminhos?

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Eu quero ter 45 para...


Dizer tudo sem precisar abrir a boca.

Lembrar da Sônia Braga em Vila Sésamo, na TV em preto e branco.

Manter o corpinho de 20 e matar todo mundo de inveja.

Ver brotar na minha filha o melhor de mim..

Lembrar de Santos quase sem prédios.

Ter olhos intensos, matadores.

Pensar que até agora eu só vivi a metade – ou menos – da minha jornada.

Lembrar da Copa de 70.

Ganhar prêmios e concluir que, no fim, eles não eram tão importantes assim.

Lembrar de Londres.

Ter morado em Nova York.

Passar um aniversário em Paris.

Vestir o que me der vontade (e ficar bem nas minhas escolhas).

Conhecer o gosto de Crush.

Exibir pelo corpo marcas que contam a minha história.

Precisar provar muito pouca coisa pra muito pouca gente.

Olhar pra trás e sentir orgulho de tudo o que passou.

Saber o que busco num homem.

Aceitar com serenidade a impermanência de tudo (inclusive dos 45).

Ter amigos de 30 anos (ou menos).

Ter amigos há 30 anos (ou mais).

Ficar mais parecida com você.


Parabéns, querida.

Você é uma inspiração todos os dias.


Ilustra de autoria da própria homenageada.


quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Teçte de prutugueis


Aí, você resolve investir cinco minutos de ócio e descompressão no trabalho em um teste de caráter inteiramente educativo, como: "que tipo de ritmo/ lugar no mundo/ deusa grega/ distúrbio psiquiátrico" é você.


Quinta pergunta:
"Quais instrumentos mais te atrai em uma banda?"

Resultado:
Ritmo: jazz
Concordância: 0

sábado, 22 de agosto de 2009

Homeless

Lar é mais que casa.
É estado de espírito.
Eu estou sem teto
desde que deixei de morar em você.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

A Declaração

_ Mamãe, eu estou bonito?

_ Tá lindo, filho. Como sempre. Por quê?

_ É que hoje é um dia muito importante. Hoje, eu vou dizer pra Lívia que estou apaixonado.

_ Ué! De novo? Mas você já não disse?

_ Dãããns, mamãe! Todo mundo sabe que as garotas gostam de ouvir essas coisas vááárias vezes.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

O Presente

_ Mamãe, nós temos que comprar um presente para a Lívia.

_ Eu sei, filho. E nós vamos. Pode ficar tranquilo.

_ Quando?

_ Certamente, antes da festa. Você já pensou em alguma coisa?

_ Pensei, sim. Pensei em três coisas. Mas uma, eu já sei que você não vai deixar. Sabe qual é a que você não vai deixar?

_ Qual?

_ A sereia! Pensei numa sereia pra ela porque ela é linda como uma sereia, mas você vai reclamar porque a sereia é muito grande e não cabe na sua banheira. Ou vai reclamar porque não vai dar pra você tomar banho até a festa, né?

_ Bem, eu reclamaria de coisas diferentes, mas você tem razão. Uma sereia está fora de cogitação.

_ Eu sabia! Foi por isso que eu pensei também numa coisa bem pequenininha.

_ O que, meu filho?

_ Uma fadinha igual à Sininho do Peter Pan. Acho que ela ia adorar e cabe até num pote de geleia!

_ É verdade, mas acho que não estamos na época das fadinhas. Eu não tenho visto nenhuma pra vender ultimamente, você tem?

_ Não, mamãe. Não tenho. Que pena...

_ Pena mesmo. Qual era a sua terceira opção?

_ Um arco-íris.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

O convite

_ E então, meu filho? Como foi o primeiro dia de aula?

_ Ah, mamãe, foi maravilhoso. Paradisíaco!

_ Paradisíaco?!

_ É. Eu vi a Lívia. Ela continua linda. Mas isso não foi o melhor. O melhor é que ela me convidou para a festa dela. E ainda escreveu no convite que “sem a minha presença a festa não estará completa”.

_ Nossa! Que legal! Ela escreveu isso com a letra dela?

_ Não, mamãe. Estava com aquela letra do convite mesmo. Aquela que não é feita por humanos.

_ Ah...

_ E sabe o que foi melhor ainda?

_ O quê?

_ Que o Pedro Motta disse que não quer mais namorar com ela. Então, ela vai namorar comigo.

_ É mesmo? Mas que maravilha, filho! E você já falou isso pra ela?

_ Não. Vou falar amanhã. Mas eu não quero filhos, por enquanto.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Comidas que não (me) convencem – parte I I

Eu sou uma pessoa versátil.

Versátil e flexível.

Quase sempre.

Mas como é que uma coisa que não sabe o que é pode ser obra de Deus? Vejam a soja, por exemplo: é um grão? Sem dúvida. Mas um grão que se transforma em leite, queijo, salgadinho, farinha, carne e até hambúrguer! Como é que uma planta pode virar um hambúrguer? E leite??? Não pode ser coisa de Deus. Definitivamente.

É por isso que eu, apesar de conhecer boa parte dos benefícios trazidos pelo seu consumo moderado, confesso que tenho medo. Pronto. Falei.

Comidas que não (me) convencem – parte I

Sei que é preferência mundial e que algumas pessoas praticamente subsistem à base delas, mas eu nunca consegui gostar de verdade de salsicha. Talvez parte disso se deva a uma ou duas dores de barriga memoráveis na adolescência, causadas por consumo exagerado. Ou pelo professor de sociologia do meu ex-marido, que dizia que “quem gosta de salsicha e de política não deve perguntar do que são feitas.” e ainda que “a diferença entre uma boa salsicha e uma má salsicha é a qualidade do jornal usado na sua fabricação.”

Já tentei das marcas mais populares, às mais aclamadas. Provei de peru, de frango, de pernil, de lombo, da branca e da vermelha, com e sem especiarias, com e sem pimenta, com e sem massa em volta, à milanesa, num boteco, pra provar que não tenho medo de nada e até – pelo menos, foi o que me juraram – sem jornal. Não funcionou.

Nem com purê, nem com batata palha, em com molho de tomate acebolado, nem com mostarda e catchup num pão bem molinho. Com maionese, nem pensar. Nem no sanduíche, nem na salada.

O engraçado é que tem gente que não se conforma e tenta a todo custo me convencer a abraçar a causa da salsicha. E eu, pra não parecer chata, disfarço e filosofo: bendita seja a diversidade humana que permite que pessoas estranhas como eu vivam anonimamente, sem despertar suspeitas.

Também tem gente mais louca que eu – graças a Deus! – que, apesar da tinta – porque as salsichas são todas pintadas, não vá dizer que você não sabia!!! – e do jornal, consegue comê-las diretamente do pacote, sem nem aferventar. Nem um aguinha quente pra lavar parte do não-sei-o-que que vai ali dentro. Essas pessoas são fáceis de identificar: elas têm a área em volta dos lábios meio alaranjada nos momentos improváveis, como na saída do cinema, por exemplo. Depois morrem e dizem que a vida não é justa. Eu, hein?