quinta-feira, 28 de julho de 2005

Operação Biscoito

Tudo começou no Egito antigo, onde o cultivo do trigo tornou-se possível pela fertilidade do Nilo. Os egípcios faziam seus biscoitos com formas animais e humanas para ofereecer às divindades, em troca de chuvas. A moda foi pegando e se espalhando pelos povos do Mediterrâneo e Oriente Médio, até que os franceses (sempre eles), concluíram que se assassem o biscoito duas vezes, ele perdia umidade e se conservava por mais tempo. Daí o nome "biscoito", de biscuit, bis coctus, cozido duas vezes!*

A minha história começou por volta do dia primeiro de julho, não coincidentemente primeiro dia de férias das crianças.
_ Mamãe, vamos fazer biscoito?
_ Vamos. Mas não hoje.
_ Ahhhh, por favor....
_ Que tal você escolher uma receita primeiro?

Temos uma tradição familiar - ou um cacoete - de fazer biscoitos nas férias. Tudo começou com a minha tia, que às vezes chamava minha filha para passar o dia com ela, fazendo biscoitos. Só que a minha tia é uma pessoa livre, desimpedida e dona do próprio tempo, ao contrário de mim. E mais: ela chamava APENAS a minha filha, que tem dez anos e é praticamente uma mulher feita. O meu filho, de três, ficava de fora.

Entreguei dois livros imensos, apenas com receitas de biscoitos às crianças, ambos fartamente ilustrados e os incumbi de fazer a seleção. Achava que com isso, ganharia mais tempo. Lêdo engano.

No mesmo dia, algumas horas mais tarde, segundos depois de eu passar pela porta, vinda do trabalho, minha filha apareceu com os dois livros e uma dezena de receitas marcadas.

Entrei em casa, larguei a chave sobre a mesa, sentei na primeira superfície livre e fui ver.
_ Filha, essas não têm a menor condição.
_ Por quêêê?
_ Açúcar demerara, filha? Onde a gente vai arrumar? E essa, então! A gente ia ter que fazer "cálices" de biscoito para DEPOIS rechear com o fondant de limão?! Inviável! Íamos levar a tarde inteira! O dia inteiro! Dois dias inteiros! As férias inteiras! Precisamos de algo infinitamente mais simples. Inclusive, para o seu irmão poder acompanhar...
_ Ele VAI acompanhar?
_ É claro que sim.
_ Tá bom. Então, ele escolhe os moldes.
_ Isso, a gente negocia depois. Agora, olhe tudo de novo e separe umas receitas bem FÁCEIS para a gente fazer, tá?
_ Tá booooom!

Dez minutos depois, ficou decretado que faríamos bonecos de gengibre! Aqueles mesmo, da história do boneco de pão-de-mel (The Gingerbread Man). Eu nunca tinha feito. Problemas a vista. Porque, por mais "coisa de mulherzinha" que possa parecer, uma nova receita de biscoito é sempre um grande desafio. Biscoitos são entidades imprevisíveis. Há os que crescem, os que esparramam na assadeira (não é, Val?), os que precisam ser tirados em menos de um nanosegundo após saírem do forno (caso contrário, ficam grudados na assadeira para sempre), os que precisam arrefecer... não é para qualquer um, não.

Determinei que a Operação Biscoito só seria deflagrada quando EU também estivesse de férias. Ainda consegui ganhar mais uns dias porque precisamos comprar melado de cana. Os outros ingredientes bizarros como açúcar mascavo, glucose de milho, noz moscada ralada, gengibre em pó e outras esquisitices do gênero, acreditem ou não, eu tinha.

Ontem, não teve mais jeito. Lá pelas quatro da tarde, fomos os três para a cozinha. Mãos lavadas, aventais e meu filho, como sempre, com seu hábito de se colocar "no lugar das coisas". No caso, no lugar da farinha de trigo, do ovo, do cravo... Ele gosta de acompanhar as receitas preferencialmente de "dentro" da tigela. Fui medindo os ingredientes e minha filha, colocando. Lá pelas tantas, descobrimos que açúcar refinado e mascavo não entravam na categoria de ingredientes secos (porque a ordem era peneirar juntos, TODOS os ingredientes secos). Tivemos uma pequena discussão filosófica sobre o estado físico dos açúcares e eu entreguei a Deus... até porque, não havia mais como "desmisturá-los".

Seguimos em frente até o momento em que o livro dizia que aquilo devia ter se tornado uma massa. Não tinha. Nem remotamente. Não vou estabelecer comparações gosseiras. Direi apenas que o que havia na tigela era uma gororoba castanha e granulosa, levemente brilhante e pastosa em alguns pontos. Quem quiser que tire suas conclusões...

"Sove a massa". Ok, massa: hora de canalizar as energias. O que poderia ser essa massa para merecer uma sova? Minha fatura de cartão de crédito, claro! Apanhou um bocado, a coitada. Lá pelas tantas, pinguei umas gotinhas de leite à revelia da receita, abri uma parte na tal superfície enfarinhada e deixei minha filha encarregada de dar continuidade à surra. Digo, à sova.

A essa altura, já havíamos descoberto, para nosso desespero, que entre os nossos 712 diferentes moldes de biscoitos, não tínhamos nenhum de "boneco".
_ E agora, mamãe? Como vamos fazer bonecos de gengibre sem um molde de boneco?
_ A gente improvisa, ué!
_ Como?
_ Com bonecas! Somos meninas! Faremos bonecas de gengibre! Que tal?
_ Mas e o meu irmão?
_ Pra ele a gente faz de lua! Ele adora lua!
_ Nãããão! Quero de caminhão (ele também adora caminhão). De betoneira, escavadeira, motoniveladora...
_ Filho, não temos molde de caminhão...
_ Buáááááá!

Optamos por formas de menininhas, ursinhos de dois tamanhos e corações. Alguns ficaram meio distorcidos, o que deu um aspecto meio mutante aos biscoitos.
_ Esses são de ET. De menininhas decapitadas, de ursinhos amputados. Que tal?
_ Legal!

Aberta a massa, cortados os moldes, forno... várias vezes (porque qualquer receita de biscoito rende uma infinidade. Sempre. Biscoito é como cozido, como feijoada... não dá pra fazer só um pouquinho). Sempre naquele tempo improvável de biscoitos... 12 minutos e meio, 13 minutos e 45 segundos, com a obrigatoriedade de virar a assadeira aos 6'45" e nem um segundo a mais, para não pôr tudo a perder. Isso, da primeira vez. Porque depois, o forno vai esquentando o os tempos mudam.

No fim, por menos razoável que pareça, assamos umas seis fornadas de biscoitinhos que, para a surpresa de todos, deram certo! Meu filho ficou encantado, principalmente com os modelos mutantes. A segunda parte da missão era pintá-los hoje, com aquelas canetas maravilhosas de pintar biscoitos que minha filha tem, mas eu pulei. Tivemos um dia cheio de obrigações e na hora agá, lancei mão do meu poder de veto e bradei que "eu também estava de férias", "também merecia ócio e lazer" e adiei a operação pintura-de-biscoitos para amanhã. Mas essa é a melhor parte. Eu ADORO pintar biscoitos!

Vai um biscoitinho aí? Em dezembro, a gente faz mais!


*Informações históricas obtidas no Livro das Invenções, Marcelo Duarte.

quarta-feira, 20 de julho de 2005

Supermercado com filho, Missão Impossível

Mais difícil que fazer supermercado, é fazê-lo com um filho de três anos.

Primeiro, reze para haver o bendito carrinho-carrinho disponível. O carrinho-carrinho, diferentemente do carrinho de supermercado convencional, é aquele, com forma de caminhãozinho (as mães me endenderam de cara, tenho certeza), no qual a criança pode entrar e fingir que dirige. Felizmente, de uns tempos para cá, alguma alma caridosa tirou as buzinas desses carrinhos porque antes disso, era uma barulheira infernal. O carrinho-carrinho (doravante chamado apenas de carrinho, para não encher o saco) tem uns poucos espaços aqui e acolá, para o adulto colocar uns poucos itens. Além de ser pesadíssimo de empurrar, o carrinho é terrível de manobrar.

Também recentemente, outra alma não tão caridosa viu por bem tirar as portas de todos os carrinhos. Não sei se foi questão se segurança, para as crianças não apertarem os dedos, ou se foi por pura maldade com os pais, mas o fato é que agora qualquer ser humano com mais de dois anos tem total liberdade para entrar e sair da droga do carrinho quando bem entender.

Com o meu filho, é assim. Depois da prece habitual para haver carrinhos, eu rezo para que ele esteja "desejando" o carrinho - porque tem dia que ele deseja a motoca, muito mais rara, e aí, o carrinho não satisfaz nem a pau!

Tudo vai bem... até a primeira curva, quando eu quero comprar itens mundanos como refrigerante e Pinho Sol e ele quer ir para a sessão de brinquedos. Eu sou leonina, ele é pisciano. Eu sou a mãe, ele é o filho. Eu tenho um metro e setenta, ele tem um metro. Munida de toda psicologia infantil e de uma certa força bruta, dou um jeito de convencê-lo a deixar a sessão de brinquedos (com uma bola de basquete oficial e uma betoneira em escala quase 1:1, que ocupa praticamente todo o espaço do carrinho) e seguimos em frente.

_ Mamãe
, eu quero Sucrilhos.

_ Tá bom, filho.
_ Nãããão. O do tigre.
_ Tá bom. Vamos levar o do tigre.
_ Nããããão. O do tigre de chocolate... pequenininho.
(Calma, Ju, guarde seus "nãos" para o momento certo.)

_ Vamos pegar uma esponja de banho para o Pedro? Que tal essa linda, de pé?
_ De pé?
_ É, filho, olha só que legal! Parece o pé do Pedro. Vamos usar no seu banho. Aí, gente pode cantar "meu pé, meu querido pé, que me aguenta o dia inteiro, ô, ô..."
_ Eu não queeeeero a de pé! Meu pé não é assim. Essa é feia. Quero a de lua!
_ Mas a de lua, a sua irmã já tem.
_ Então eu quero a de coração. A de coração verde.
(Custava o dobro. Concordei, dividida entre a crença de que uma esponja de coração não era algo muito viril e sentindo-me ridícula por julgar a virilidade com base numa besteira dessas.)

Alguns itens depois, ele começou a perder a paciência. A dele, porque a minha, eu já havia perdido vários corredores antes. Quando perde a paciência, meu filho se levanta cada vez que o carrinho pára (alguém tirou as portas, lembram?). Se levanta e sai correndo, desgovernado, para virtualmente qualquer lado. E eu, evidentemente, atrás dele. A única forma de mantê-lo dentro é não parando o carrinho. Agora, eu quero que alguém me diga como escolher, comparar preços E acomodar produtos no espaço exíguo do maldito carrinho SEM pará-lo. Parece uma maratona maluca, quase um jogo de basquete: eu empurro o carrinho com um pouco mais de força para a frente e, aproveitando a inércia, vou pegando e atirando latas de molho de tomate e pacotes de macarrão dentro dele, rezando para não errar a mira e acertar algum transeunte desavisado. Depois, corro para aparar o carrinho, ainda em movimento, com filho dentro e tudo.

A pior parte é quando a falta de paciência se soma ao tédio. Aí, em vez de levantar do carrinho, ele estica a mão para fora e sai fazendo strike em todas as prateleiras. Ameaço amarrá-lo ao volante e ele abre um berreiro (ODEIO criança que dá escândalo). Tento negociar uns 15 minutos de permanência no espaço infantil. No way! Suborno com uma caixinha de suco de manga e ganho mais 3 minutos e 10 segundos, tempo suficiente para chegar, pálida e ofegante ao caixa.

_ Pronto, mamãe. Primeiro, a betoneira do Pedro.
_ Moça, por favor, qual é o preço da betoneira?
_ Noventa e oito reais, senhora.
_ O quê? NOVENTA E OITO??? Pedro, a betoneira não vai.
_ Mas eu "preciso" da betoneira!
_ Não.
_ Buáááá!
_ Pode chorar à vontade. Não vamos levar.
_ Então eu vou pedir pro papai!
_ Ok. Quer meu celular?
_ Buáááááááá!

Termino de pagar, enfio tudo de volta no carrinho, criança inclusive e voltamos para o carro. Agora, só falta carregar, descarregar e guardar tudo em casa.
Ah, as férias...

sexta-feira, 15 de julho de 2005

Disciplina

Tem dia que a noite é curta
E a gente dorme pouco
E o nosso time ganha
E o povo comemora a noite inteira
E a gente acorda com sono (apesar da sensação boa de dever comprido – e cumprido)
E no dia seguinte tem que trabalhar
Di-rei-to
E fazer tudo no capricho
Sem latir pra ninguém
Sem reclamar
E de noite, quando chega em casa, morto,
A gente tem que brincar com os filhos
E pedir pizza porque hoje é sexta
E deixar dormir tarde porque amanhã é sábado
E pensar na semana porque estamos de férias
Sem ficar de mau humor
Sem deixar a peteca cair
Porque tem dia que a noite é curta
Mas ninguém tem nada com isso.

(In)Crédula

Eu acredito em preguiça depois do almoço.
Eu acredito em manter boas tradições de família.
Eu acredito em nadar milhares de quilômetros para manter a forma.

Eu acredito em dormir acompanhada.

Eu acredito na Fada do Dente.
Eu acredito no Homem Ideal.
Eu acredito no sorvete de chocolate com calda quente da Haagen Dazs.
Eu acredito em mudar de idéia.
Eu acredito em dar o braço a torcer.

Eu acredito em recomeçar.
Eu acredito em insistir no que se realmente acredita.
Eu só não acredito no meu filho ontem à noite, empilhando bichos de pelúcia para sair do berço!
Francamente!

quarta-feira, 6 de julho de 2005

Você sabe que tem uma criança pequena em casa quando:

- Tem uma barraca dos Incríveis com capacidade para um adulto médio na sua sala de televisão.

- Tem uma Mercedes conversível do tamanho de uma televisão de 34 polegadas na sua sala de visitas.
- Não entende porque em alguns desenhos do ursinho Pooh o menino se chama Cristóvão e em outros se chama Paulo Roberto.
- Conhece todos os cento e um dálmatas, pelo nome.
- Pega um band-aid na bolsa e descobre que é do Bob Sponja.
- Tem carrinhos no chão em todos os cômodos da casa.
- Tem um pote de Baby Wipes no porta-luvas do carro.
- Tem um velocípede-motoca na área de serviço.
- Tem carrinhos Matchbox dentro de todos os sofás.
- Conhece todos os episódios de todas as fitas do Castelo Rá Tim Bum.
- Sabe todas as músicas de todos os longa-metragens da Disney.
- Já entrou em discussões acaloradas sobre as vantagens dos Matchbox versus os Hotwheels.
- Sabe, em menos de 5 segundos se está assistindo a Mogli I ou II (sim, existe Mogli II!)
- Sabe de longe diferenciar B1 de B2.

- O porta-malas do seu carro tem capacidade para até 1.800 litros de carga.
- Começa a descobrir semelhanças incríveis entre os personagens de desenhos animados e as pessoas que você conhece.
- Seu filho chama você de "Dona Jumbo" e você sabe que não tem nada a ver com excesso de peso.
- Faz bolo em casa todo fim de semana, com calda.
- Acha os desenhos do Cartoon Network "adultos" demais.

- Pensa nas férias dela muito antes de pensar nas suas.
- Junto dos seus CDs de Maxwell, Macy Gray, Mobe e Manu Chao, você tem também Palavra Cantada, Arca de Noé e Saltimbancos.
- Quando entra em casa, a primeira coisa que sente é o cheirinho de Lavanda Johnson’s.
- Não suporta o Barney mas sabe todas as coreografias.
- Lamenta que Little People passe tão cedo.
- Não vê a hora de ter um tempo para você e quando tem, morre de saudade dela.