quarta-feira, 28 de julho de 2010

Meteorologia

_ Mamãe?

_ Oi, filho.

_ Podemos conversar sobre alguma coisa?

_ Claro. Sobre o que você quer conversar?

_ Podemos conversar sobre o tempo?

_ Podemos, sim.

_ Então, no tempo dos dinossauros...

_ Que tal a gente falar de algo mais comum sobre o tempo, filho?

_ Tá. Se eu pudesse voltar no tempo...

quarta-feira, 19 de maio de 2010

A mãe do Ian

Todo mundo tem mãe.

Tem mãe que é separada do pai e cria o filho sozinha; mãe que é separada e quem cria é o pai; mãe que mora em outra cidade e o filho é criado pela tia ou pela avó. Tem mãe que é brava, mãe que é legal e até mãe que de vez em quando a gente tem vontade de trocar por outra. Até a Marina tem mãe, só que a dela morreu. Tem também mãe que não tem filho, mas que cria o filho dos outros como se fosse seu e vira mãe de verdade. Todo mundo tem mãe porque todo filho nasce de uma barriga e a barriga só pode ser da mãe.

Todo mundo tem mãe, menos o Ian.


_ Por que você diz que o Ian não tem mãe, filho?

_ Porque ele não tem mesmo, mamãe. Foi ele quem disse!

_ Mas, filho, isso não pode ser. Como o Ian nasceu se não tem mãe?

_ Não sei, mas ele disse que não tem.

_ E por que ele diz isso?

_ Porque a mãe dele tem cabelo roxo.

_ Ah, então ele TEM mãe!

_ Tem, mas ele diz que não tem porque o cabelo dela é roxo.

_ Ah, filho, que injustiça! Não é porque ela tem o cabelo roxo, que deixa de ser mãe dele. Como o Ian é careta... Aliás, aposto até que o cabelo dela nem deve ser tãããão roxo assim. Deve ser um castanho escuro com reflexos acobreados e o Ian que é implicante.

_ Não é, mamãe. Você vai ver na reunião. Coitadinho do Ian...


Fui à reunião e, lá pelas tantas, entrou uma mulher de trinta e poucos anos e cabelos roxos. Roxo intenso. Longos fios cor de beterraba descendo até os ombros. Fiquei ali, olhando e pensando se ela sabia do efeito que aquilo provocava em um menino de oito anos.

Sei que a mãe do Ian não lê esse blog e respeito demais a individualidade humana para me meter num ninho de pulgas desses, mas se você, leitora, tem cabelos roxos ou de qualquer outra cor que não exista na natureza & um filho de oito anos, reconsidere.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

O fim do mundo

Meu filho está preocupado com o fim do mundo. Genuinamente preocupado.

Todas as noites, quando chego em casa, ele me bombardeia com perguntas sobre chuvas ácidas, cataclismas e asteróides de altíssimo poder de destruição. Hoje, estava particularmente tenso com o buraco na camada de ozônio.
Mal sabe ele que não há com o que se preocupar.
Afinal, o mundo já acabou. E não é de hoje.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Força de expressão

_ Boa noite, meu filho!

_ E aí?

_ Tudo bem com você? Vem cá me dar um beijo. Como foi na escola, e na natação, e no karatê?

_ Ah, véi, foi tudo bem; eu aprendi a virada olímpica e um golpe novo que...

_ Peraí! Momentin! O que foi que você disse, Montanha?

_ Que aprendi a virada olímpica e um golpe...

_ Não! Antes disso.

_ Antes eu disse que “tudo bem”.

_ Filho, do que foi que você me chamou?

_ Acho que de mamãe. Sei lá, cara!

_ Olha aí! Você fez de novo!

_ Fez o que, véi?

_ De novo, de novo! Estou tendo alucinações ou você está me chamando de “véi” e de “cara”?

_ Ah, é só força de expressão...

_ Pois póparar com essa “força de expressão”.

_ Mas todo mundo fala assim, véi!

_ Aaaaaaiii, Pedro! Para com isso agora mesmo! E para sempre, entendido? Mesmo que TODO MUNDO fale assim, você não falará. Não nesta vida. Não enquanto eu for sua mãe, entendeu?

_ Mas, mãe...

_ Mamãe, filho. Ou Dona Mamãe, se você preferir. Humpf! Era só o que me faltava.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Material escolar

Sabe quando tem revista no presídio e a polícia apreende 50 celulares, 5 punhais, 18 facas de cozinha e 32 granadas domésticas?

Foi como eu me senti hoje cedo, filho, na reunião com a sua professora, quando ela começou a enfileirar os itens apreendidos de você nas últimas semanas.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Unplugged

Trim, trim, triiiiiiiim!

_ Alô?

_ Mamãe?

_ Oi, filho.

_ Posso, só hoje, só hoje, ligar o Wii antes das quatro da tarde?

_ Não.

_ Não mesmo?

_ Não.

_ Mas eu já acabei a lição.

_ Ok. Mas a gente já combinou que até as quatro você fica fora da tomada. Vá brincar de outra coisa.

_ Ok.

(20 minutos depois)

Trim, trim, triiiiiiiim!

_ Alô?

_ Mamãe?

_ Fala, filho..

_ Tô ligando só para que você saiba que eu estou sofrendo muito.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Decisões


_ Mamãe, eu tomei uma decisão.
_ Ai, filho, estou com um mau pressentimento. Que decisão foi essa?
_ Resolvi que, definitivamente, eu vou parar de estudar.
_ Hmmm... acho que essa decisão não cabe a você, filho.
_ Por quê?
_ Porque você só tem oito anos e por mais uns quinze vai ter que estudar, quer queira, quer não.
_ Vou?
_ Vai.
_ Mas... e se eu quiser ser astronauta?
_ Bem, astronautas têm que estudar muita física, química, astronomia, geometria, matemática e biologia.
_ Credo! E se eu quiser ser explorador, arqueólogo?
_ Exploradores e arqueólogos precisam ser craques em história e biologia.
_ Um bombeiro, talvez...
_ Bombeiros têm que conhecer anatomia, dominar primeiros socorros e atendimento de emergência e saber um bom tanto de física e química também.
_ Já sei! Vou ser artista.
_ Artistas têm que saber história, matemática e geometria para entender de proporções e perspectiva e alguma química para misturar materiais.
_ Saco!
_ É. Eu imagino que seja. De qualquer modo, acho que você entendeu que tem que estudar, né?
_ Entendi.
...
_ Mamãe... e se eu quiser ser príncipe?
_ Bem, filho, nesse caso, você vai ter que estudar tudo isso e muito mais para conquistar uma princesa.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

O seu coração

E quis o destino que depois de uma longa pausa, meu coração reencontrasse o seu. E fomos, aos pouquinhos, redescobrindo o sentido de tudo, a graça de tudo, a beleza de tudo. Descobrimos que Deus, esse gozador, tinha planejado as coisas desde o início; inclusive a nossa separação.

E não é que esse mesmo Deus, brincalhão, colou meu coração no seu com Super Bonder celeste e quando ele estava bem colado, fez o seu coração entupir?

E de repente, sem maiores avisos, ali estava o seu coração na mesa do centro cirúrgico e o meu na boca, de nervoso, tendo que deixar aquele povo de branco picar, espetar, furar, cutucar você de tudo quanto é jeito.

Sete dias, meu amor. Uma semana inteira em que o seu coração bateu em primeiro plano e o meu bateu apertado, morto de medo. Fiz a única coisa que poderia fazer: suspendi tudo e fui ficar perto do seu coração. Afinal, onde mais o meu poderia estar?

E agora que essa taquicardia emocional passou, só nos resta cuidar com todo carinho de você e esperar seu coração cicatrizar. E ele vai, meu amor. Vai porque não há lugar mais amplo, macio e quente que esse músculo que bate dentro do seu peito. Vai porque a gente tem muito o que viver junto. E vai, principalmente, porque sem o seu coração, o meu não tem mais como ser feliz.

Deus te guarde.

De repente

Eu passei por aqui quase sem querer e me deu uma saudade danada de mim.

Deve estar na hora de me visitar. Será que eu lembro meus caminhos?