terça-feira, 26 de agosto de 2008

Perguntas incandescentes

_ Mamãe, por que Saturno tem anéis? Quando é primavera em Netuno? Faz lua cheia em Vênus? Neva em Júpiter? O que tem no interior de Urano?

_ Páááááára, meu filho! Pára, pelamordedeus! Tenha piedade da sua mãe. Eu não sei. Não sei, não faço idéia, nem desconfio, tá bom?

_ Mas você disse que ia pesquisar pra mim...

_ Eu disse e estou pesquisando, filho. Eu já comprei livros, já lemos Atlas e já alugamos filmes. Só que eu não sou astrônoma, não trabalho na NASA e nos intervalos entre uma pesquisa e outra, eu preciso trabalhar pra alimentar os terráqueos que moram comigo.

_ Tá bom... Posso fazer só mais uma pergunta?

_ É sobre planetas, buracos negros ou outras galáxias?

_ Não. É sobre lava.

_ Ai, Xisus. Lá vamos nós de novo. Manda, menino.

_ Sabe a lava vulcânica?

_ Sei.

_ Aquela que você disse que era como se a Terra vomitasse?

_ Sei, filho. Progride.

_ O que acontece se eu fizer cocô na lava?

_ O quê???

_ Cocô, mamãe. O que acontece?

_ Acontece que você morre porque a lava é quente demais; é como um rio de fogo incandescente e se você chegar perto o bastante para ir ao banheiro, será carbonizado na hora.

_ Sei, mas e se eu usar minha super roupa de chumbo e amianto indestrutível?

_ Vai ser um inferno ir ao banheiro usando um troço desses...

_ Mamãe... colabora, vai.

_ Ok, filho. Se você jogar fezes na lava, eu acho que as fezes viram pedra.

_ O cocô vira pedra?!

_ Acho que sim, filho.

_ De que cor?

_ Ah, sei lá. Acho que preto.

_ Preto?! Uau!!! Por quê?

_ Porque carboniza, filho. Vira carvão.

_ Legal! E se eu fizer xixi na lava?

_ Xixi, vejamos... acho que evapora.

_ Evapora? Vira vapor? Vapor de xixi? Irado! E se eu vomitar na lava?

_ Eca, filho! Que nojo!

_ Ué, mamãe, não foi você mesma que disse que a lava era como se a Terra vomitasse? Se a Terra pode vomitar, por que eu não posso? Eu, hein...

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Problema de gravidade

_ Mamãe, por que é que a gente fica na Terra?
_ Como assim, meu filho?
_ Por que é que a gente fica pregado, na Terra?
_ No chão, você quer dizer?
_ É. Por que é que a gente não sai voando?
_ Bem, a gente não sai voando porque não tem asas e porque não foi feito para voar. A gente fica preso na Terra por causa da força da gravidade.
_ O que é isso?
_ É uma força que atrai tudo o que está na superfície para o centro da Terra. Ela mantém tudo o que está aqui, grudado no chão.
_ Tudo?
_ Tudo, meu filho.
_ Até os prédios?
_ Até os prédios, até os elefantes, tudo, tudo.
_ Menos os passarinhos, né?
_ Rsss... a gravidade atua sobre os passarinhos também, só que eles têm asas e por isso, voam.
_ Então é uma força muito forte, né, mamãe?
_ Muito, muito forte, meu filho.
_ Mais forte que os dinossauros?
_ Muito mais forte que os dinossauros.
_ Mas... e se força da gravidade acabar?
_ Isso não vai acontecer.
_ Como é que você sabe? Porque os dinossauros também eram muito grandes e muito, muito fortes e acabaram, né?
_ É, filho. Mas a gravidade não vai acabar.
_ Promete?
_ Prometo. As chances da gravidade acabar são iguais às chances do oxigênio acabar.
_ O oxigênio também pode acabar? Ai, meu Deus!...

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Dia de sorte


Sorte é uma coisa engraçada.

Depois de cinqüenta minutos dentro do carro, num percurso que não deveria levar mais de vinte, chego, finalmente, às imediações de casa.


Hora do almoço, muita gente na rua. De dentro do carro, vejo duas moças fumando. Deviam ter acabado de almoçar e estavam voltando para o trabalho. As duas apagam o cigarro ao mesmo tempo, jogando as pontas na calçada.


Olho e concluo baixinho que educação é algo que se (des)aprende cedo.


A uns dois metros dali, um mendigo pára de cutucar o lixo e ergue os olhos, sorrindo. Num gesto quase de dança, ele se volta na minha direção, inclina-se para o carro e diz, divertido, do lado de lá do vidro:


_ Hoje é meu dia de sorte.


Acompanho seus movimentos pelo retrovisor e o vejo se abaixar e pegar as duas pontas de cigarro do chão. Duas de uma vez! E acesas, ainda por cima! É. Sorte é mesmo uma coisa engraçada. Engraçada e relativa.