sábado, 31 de março de 2007

Coisas

Bajofondo, Florina, meu vinho, sua cerveja, gel no cabelo, a camisa que eu gosto, o sapato que você gosta, padaria no meio da noite, deitar tarde, massagem nas costas até você dormir, acordar tarde, ar condicionado, omelete no café da manhã, baveuse!, seu pão, Cultura FM, molhar as plantas do terraço, robes, jazz instrumental, filme na cama, seu cigarro, fazer nosso almoço, sorvete da La Basque, café na xícara vermelha, escolher músicas no computador, falar de mim, saber de você, catalogar os DVDs, planos para a semana... se eu sinto sua falta? É claro que não. Eu nem lembro que você existe. O único problema é o cheiro do seu perfume que ainda não saiu do cinto de segurança do meu carro!

sexta-feira, 30 de março de 2007

Moving out

Escrevo para avisar que você está de mudança.

O lugar que você ocupa não estava mais bom. Tinha ficado úmido, cheio de goteiras e infiltrações e fazia tempo que você não era feliz lá.

O novo espaço é amplo, arejado e você terá a companhia de pessoas adoráveis. Gente que passou pela minha vida nos mais variados momentos e que me fez muito feliz. Também há pessoas que me fizeram mal (poucas, graças a Deus), mas essas ficam espremidas em um cubículo permanentemente trancado com uma chave beeem grande e pesada, só para eu lembrar que existiram e não correr o risco de deixar que me machuquem de novo.

O lugar para onde você vai é acolhedor. Reservei uma suíte com máquina de café expresso, cama king-size, colchão da densidade exata para não lhe dar dor nas costas e lençóis de algodão egípcio. Você poderá até puxar conversa, se quiser. Tenho certeza de que encontrará excelentes companhias e que só falarão de coisas boas. Porque esse espaço, justamente por ser tão seletivo, não aceita mágoas, rispidez ou a frieza com a qual você está tão acostumado. Talvez isso o incomode... Esqueci de mencionar que apesar de arejado, lá é quente – e eu sei que você só se sente bem no frio. Para garantir seu conforto, prometo encomendar um sortimento vitalício de sorvete de chocolate, um home theatre de primeiríssima qualidade e uma TV com tela gigante. Fique à vontade.

Porque hoje, você sai da minha vida para ir morar na minha memória.

quinta-feira, 29 de março de 2007

Sabedoria divina

Benditas sejam as dores de cotovelo porque é delas o reino dos blogs (dos meus, pelo menos).

quarta-feira, 28 de março de 2007

Coleguinhas de trabalho

Sim. Eu tenho cacoetes. E olha que não são poucos.

Aliás, se alguém disser que não os têm, que vá procurar apoio psicológico com urgência porque não há ser humano normal sem cacoetes.

Um dos meus – muitos – é o de tirar os sapatos embaixo da mesa, no trabalho. Faço isso alegremente, principalmente no verão, quando em geral estou de sandálias, facílimas de pôr e de tirar.

Só que eu sou publicitária. E publicitário, como todos sabem, é um povo bondoso, sem qualquer maldade no coração. Pois bem. Estava eu um dia sem sapatos, sentada em posição de Buda na minha cadeira, trabalhando em silêncio, sem atrapalhar ninguém, em um dia ensolarado como hoje.

Lá pelas tantas, alguém me chama.

_ Ana, você pode vir aqui, por favor? O cliente já chegou para a reunião.
_ Posso. Claro.

Lentamente, descruzo as pernas e começo a tatear o chão com os pés, à procura das sandálias. Nada. Afasto a cadeira, olho para baixo, saio da cadeira, rastreio toda a área com os olhos, ajoelho no chão e procuro desesperadamente as sandálias. Nem sinal. Levanto.

_ Ok, pessoal. Legal. Rá, rá, rá! Agora devolvam, que o cliente está esperando.

Silêncio.

_ Caramba, gente, na boa, eu tenho reunião AGORA. Quem foi?

Em todas as direções, caras da mais pura inocência. Um verdadeiro rebanho de cordeiros, cada qual mais concentrado que o outro.

_ Gente, é assim, ó: eu não posso ir à reunião descalça. Então, eu vou fingir que vou lavar as mãos e na volta minhas sandálias estarão aqui, tá? Aí, num dia que não tiver reunião, vocês escondem de novo, combinado?

Nem um pio.
Fingi que fui lavar as mãos, voltei e nem sinal das sandálias.

_ Ok, pessoal. Eu vou ter que ligar para a secretária da diretoria e dizer que não vou poder ir à reunião porque vocês sumiram com as minhas sandálias. Dou-lhe uma, dou-lhe duas...

_ Alô, secretária? Então, eu estou com um probleminha aqui. Eu sei que o cliente está esperando. Eu sei que já está todo mundo na sala e SÓ FALTA EU. É que os meus coleguinhas de trabalho deram um sumiço nas minhas sandálias e eu não posso ir à reunião descalça, né? Já pedi, criatura. Já até fingi que fui lavar as mãos pra eles devolverem, mas não adiantou. Você me liga de volta? Ok. Eu espero.

...

_ Alô? Não, não devolveram. É CLARO QUE EU TENHO CERTEZA QUE VIM TRABALHAR DE SAPATO! Sei, sei. Ah, estão todos sentados, é? Você acha mesmo? Então tá.

Levantei e fui para a reunião. Descalça. Antes de entrar, ainda consegui ouvir uma explosão de risos vindos da área da criação.

Se me devolveram as sandálias? Devolveram, sim. No dia seguinte. No dia do sumiço, fui para casa descalça, rezando para não precisar descer do carro.

Se eu parei com o hábito? Parei, não. Aliás, agora mesmo estou descalça, com as pernas cruzadas em cima da cadeira. Só que agora eu tenho um par de sandálias extra, escondidas na gaveta. Rá!

Opções

Ontem, em longa conversa com a minha tia querida – aquela, que eu quero ser quando crescer – ela disse:

_ Ana, eu estou muito orgulhosa de você.
_ Puxa, tia... obrigada. Por que mesmo?
_ Porque você foi muito corajosa na decisão que teve que tomar.
_ Decisão?
_ É. De optar entre o amor e a escrita.

Desligamos o telefone quase uma hora depois e eu fiquei pensando: não deveria ter que ser uma opção.

Bacalhau na Bolsa

Hoje tem coluna minha com receita de bacalhau
no
Bolsa de Mulher. Pra quem gosta, é um prato cheio.

terça-feira, 27 de março de 2007

O naufrágio

Aí, aos dezesseis anos, eu ganhei o direito de usar lentes de contato e minha vida mudou. Exatamente como naqueles comerciais péssimos da Bausch & Lomb, passei a ver o mundo cheio de detalhes que, de repente, tinham ido parar lá, vindos sabe-se Deus de onde.

Só que usar lentes é uma arte que exige alguma técnica. Chorar, por exemplo. Quem usa lente nunca mais chora do mesmo jeito, fazendo, buááá, buááá, sob o risco de perder algumas centenas de reais em um lenço de papel. Coçar o olho é outra coisa que requer prática & habilidade da tribo dos míopes disfarçados. Há um jeito todo especial de coçar para impedir que a lente se precipite. Mulheres aprendem rápido que não podem tirar as sobrancelhas usando lente (o que torna impossível fazer o serviço sem ajuda de terceiros) e que o rímel à prova d’água é a melhor invenção da cosmética, desde os tempos do leite de cabra de Cleópatra.

Eu, iniciante que era, ainda não sabia de nada disso, o que garantiu uma série de surpresas, nem sempre boas. Como no dia em que fiz minha mãe me levar à clínica, berrando dentro do carro, porque a lente – na época, gelatinosa – tinha dobrado e ido parar na pálpebra superior. Só que, para meu desespero, a danada não tinha ficado ali, quietinha, dobrada ao meio. Virou uma espécie de trouxa de contato, quase impossível de ver e muito menos de tirar do olho. E eu, urrando de pânico, com medo da lente romper as fronteiras do globo ocular e ir parar no cérebro. Teria idéias visionárias, certamente. Mas não era tão otimista naquela época.

Pior ainda foi no dia em que, já fora de casa e iniciada nas “delícias” do café da manhã britânico, perdi uma lente em um prato de sucrilhos com leite. É claro que o primeiro impulso, felizmente contido, foi o de mergulhar na tigela para resgatá-la.

Parêntese: nessa época, eu comia apenas sucrilhos. Com o tempo e a convivência, passei a consumir cereais bem menos apetitosos, daqueles parecem já ter sido mastigados & digeridos previamente, antes de chegarem ao prato. Fecha parêntese.

O fato é que lá estava eu, atrasada para a faculdade, com uma tigela semi cheia de sucilhos e uma missão quase impossível. Dei o alerta.

_ Socoooorrrro! Minha lente caiu nos sucrilhos!
_ Ohmigod! E agora?
_ Agora, eu preciso da lente de qualquer jeito. Não tenho a menor condição de ir caolha para a faculdade.
_ Vai de óculos, ué!

Fulminei o autor da frase com o olho que ainda enxergava. Francamente! Qualquer pessoa com mais de dezessete anos sabe que é mais fácil fazer um boi voar, do que convencer uma adolescente a ir para a faculdade de óculos.

_ Não vou nem morta. Tenho que achar a lente e já!

De repente, a providência divina fez com que surgisse uma peneira na minha frente.

_ Côa os sucrilhos, Ana. Você tira o leite e fica mais fácil achar a lente.

Fui com a tigela e a peneira para a pia e esvaziei o líquido. Nem sinal.

_ E agora?
_ Agora, você vai pegando os sucrilhos um por um e vendo se a lente não está grudada nele. Se não estiver, você joga o sucrilho fora.
_ Mas e se eu não vir a lente grudada e jogar o sucrilho fora? Eu ainda nem acabei de pagar essa lente...
_ Olha direito, né, Ana?
_ Como?

Alguém faz idéia de quantos sucrilhos cabem em uma tigela com leite? Pois eu digo: setenta e seis, depois de duas colheradas. Fiquei mais de meia hora ali, quase chorando, míope feito um morcego, examinando sucrilho por sucrilho até encontrar o maldito pedacinho de silicone. E alguém acha que consegui ir para a faculdade de lente? Nãããão! A lente estava tão engordurada e açucarada, que mesmo depois de duas ou três lavagens e enxaguadas, tive que deixar a danada fervendo para poder voltar a usar.

E antes que perguntem, não. Eu não fui de óculos. Fui com uma lente só, sentei bem na frente e pedi delicadamente aos professores que, excepcionalmente naquele dia, escrevessem com letra beeem grande.

Dúvida

Fico aqui pensando: será que alguém que viveu ou foi obrigado a experimentar o desamor na vida, aprende a usar esse mesmo desamor como forma de castigar os outros?

segunda-feira, 26 de março de 2007

Eu tenho pressa, eu tenho muita pressa!

Aí, você continua correndo contra o tempo como de hábito, só sai de carro com a sirene ligada e quando finalmente chega no trabalho e deixa a bolsa na gaveta, descobre que esqueceu o celular no banco do passageiro. Droga! Sem perder um minuto sequer, você voa para o elevador e desce na velocidade da luz. Uma vez na garagem, percebe que esqueceu na bolsa o crachá para abrir a porta. E, não. O manobrista não vai quebrar seu galho. Furiosa e ainda mais atrasada, você pega o elevador novamente, sobe feito um raio, pega a droga do crachá, desce pela escada para ganhar tempo e quando chega na garagem, descobre que esqueceu a chave do carro. Você sobe pela terceira vez, pega a bolsa com tudo dentro, entra no elevador e desce feito um tufão, espumando pelas orelhas. Na garagem, abre a porta com o crachá, abre o carro com a chave e... meleca! O que você tinha ido pegar mesmo?

Tem coisas que só a pressa faz pra você.

Tão linda!

_ Mamãe, você está tãããão linda!

(Ah, que coisa doce para uma mulher ouvir de um homem em uma segunda-feira às sete da manhã. Mesmo que ele tenha cinco anos de idade).

_ Ah. Meu amorzinho, obrigada. Você ilumina meus dias. Agora, tome seu café da manhã, que a mamãe vai levar a sua irmã na escola e já volta pra te buscar, tá?
_ Mas você vai levar ela “assim”?
_ Assim como, filho?
_ Com “essa” roupa?
_ Mas você não acabou de dizer que eu estou “tãããão linda”?
_ Linda de camisola, né, mamãe?
_ Mas isso não é camisola, filho. É um vestido de linho, forrado, cru, de modelagem suficientemente ajustada para deixar claro que a sua mãe não é um bagulho, mas não o bastante para transmitir qualquer traço de vulgaridade.
_ Mas parece camisola...
_ Mas não é filho! E a mamãe está de colar, olha só! E de sapatos altos!
_ Então você dormiu de vestido?
_ Não, moleque! Que idéia é essa? Até passei o vestido a ferro hoje cedo para não ficar amassado. Isso é linho, menino. Li-nho, entendeu? E linho amassa!
_ Kkkkkkk!
_ Por que você está rindo?
_ Por que você vai sair de camisola e colar!

domingo, 25 de março de 2007

Diferente, mas bom

Tudo começou no sábado, prenunciando os contornos de um domingo diferente. Diferente porque nesse último ano e meio (ou quase), meus domingos foram – parecidos ou diferentes – sempre com você. Esse, não.

_ Filha, quer ficar com a mamãe em vez de ir para a casa do papai com o seu irmão?
(Foi golpe baixo, eu sei. Ela é sensível, doce e profundamente companheira. Nunca nega ajuda ou presença a quem sabe que precisa. A pá de cal foi a promessa de almoçar no domingo em um lugar pra lá de especial.)

_ Hmmm... quero!
(Bem que eu devo isso a ela. Esses domingos, digo. Momentos só nossos, em que ela seja o que raramente consegue ser: o centro das atenções. Momentos em que possamos dormir à vontade, ver o que quisermos na televisão – temos duas, se preciso for, uma para cada uma – conversar, jogar jogos de peças delicadas sem o risco do irmão-Godzilla lançar um chicote magnético ou uma flecha-laser-incendiária e destruir o tabuleiro).

_ Posso dormir na sua cama, mamãe?
_ É claro que pode, filha.
(O racional dela: “aí, amanhã, a gente só tem uma cama para arrumar.”
O emocional dela: “sinto falta de ficar com você.”
O meu racional: “ótimo. Aí, se fizer calor demais, a gente só precisa ligar um ventilador de teto!” O meu emocional: “também sinto.”)

Dormimos. Ela se mexe, fala, suspira, espirra e range os dentes, mas é bom. Disse que estava com um pouco de dor de garganta, mas acho que faz parte do processo de captar atenção. De noite, passei a mão no bracinho. Ali, a pele ainda é de bebê apesar dos quase doze anos de idade. Fiquei me perguntando com quantos anos a pele perde essa textura de anjo.
Acordamos, ela primeiro, tomamos café com calma e sem ouvir os sons familiares do Discovery Kids ao fundo.

_ Ele faz falta, não é, mamãe? (Pensava do irmão)
_ Faz, filha. Mas é bom, não é?
_ É _ disse, rindo meio encabulada.

Jogamos duas partidas de um jogo que eu não praticava desde antes dela nascer. Para ela, foi a primeira vez. Menina sabida, sagaz. Venceu a primeira e praticamente empatou a segunda. Deve ter puxado a mãe! Jogamos em cima da cama, de camisola, com a televisão ligada. Bom, muito bom.

Agora, ela foi dar uma voltinha e eu começo a me arrumar para o almoço prometido. Enquanto me arrumo, penso que ela merece mais momentos assim. Eu também.

Foi isso, basicamente. Um domingo diferente. Diferente, mas bom. Muito bom.

sexta-feira, 23 de março de 2007

Sabe do que mais?

Arrume outra.
Desculpa, conversa, saída, história, distração, pendência, muleta, motivação, diversão.

Arrume outra.
Massagista, fisioterapeuta, secretária, cozinheira, motorista, estilista, saco de pancada.

Arrume outra.
Mais fácil, mais alta, mais magra, mais atenta, mais paciente, mais dedicada, mais discreta.

Arrume outra.
Que fale espanhol, que fale menos, que fale as coisas certas, que fale só depois de pensar.

Arrume outra.
Menos ácida, menos sarcástica, menos irônica, menos esquentada, menos mãe, menos ansiosa.

Arrume outra.
Que não se exaspere, que não chore, que não diga que vai embora, que não sinta sua falta.

Arrume outra.
Que seja sempre doce, sempre mansa, sempre calma, sempre sensata, sempre apaixonada.

Arrume outra.
Que te ame direito, que te mime direito, que te respeite direito, que te entenda direito.

Arrume outra.
Que te emocione, que te motive,
que te estimule, que te dê vontade, que te dê saudade.

Arrume outra (ou várias outras) que saibam ser tudo o que eu fui e que sejam, principalmente, o pouco que eu não soube ser.
Aí, de repente, você vai ser feliz!

Da relatividade do tempo

_ Essa semana passou tão rápido, não é, mamãe?
_ Passou, filha. Está passando.
_ Ah... eu adoro semanas que passam bem rápido e fins de semana que demoooooram pra passar.
_ Eu também.
_ Ah, sabe o que eu mais queria, mamãe?
_ Um fim de semana de cinco dias e uma semana de dois?
_ Errou! Queria que os fins de semana durassem tanto quanto as aulas de história.

O pior é que eu entendo.

Ah, como é doce o recomeço...

_ Brega esse seu template, hein, Ana?
_ Você achou?!
_ Putz...
_ Bem, eu queria uma coisa mais moderna, mais atual, mas não achei nada que me agradasse. Os poucos que eu gostei, por algum motivo, não estão mais nos “padrões Blogger de publicação” e todos deram pau. Um dia, tenho esperanças de convencer alguém com talento real a fazer um template único, especial e personalizado, que tenha esse ar de decadência-contemporânea-urbana com o qual eu tanto me identifico. Enquanto isso...

_ E esses troços voando aí... são urubus?
_ São. Devem ser... provavelmente vieram porque sentiram o seu cheiro!

quinta-feira, 22 de março de 2007

Mariana Aydar - Deixa o Verão

Meio Amélie Poulain, meio impressionista e uma linda, linda voz.
Um tom meio bolero, meio preguiça, mas cheio de vontade.
Uma letra com conteúdo (graças a Deus!!!)
Só senti falta da presença masculina; talvez seja o hábito...
Enfim, eu gosto.


Deixa o Verão
(Letra, Los Hermanos. Intérprete: Mariana Aydar)

Deixa eu decidir se é cedo ou tarde
Espera eu considerar
Ver se eu vou assim chique, à vontade
Igual ao tom do lugar

Enquanto eu penso você sugeriu
Um bom motivo pra tudo atrasar
E ainda é cedo pra lá
Chegando às 6 tá bom demais
Deixa o verão pra mais tarde

Deixa, deixa o verão
Deixa o verão pra mais tarde

Não tô muito a fim de novidade
Fila ou banco do bar
Considere toda a hostilidade
Que há da porta pra lá

Enquanto eu fujo você inventou
Qualquer desculpa pra gente ficar
E assim a gente não sai
Esse sofá tá bom demais
deixa o verão pra mais tarde

Deixa, deixa o verão
Deixa o verão pra mais tarde

E eu digo "cá" entre nós
Deixa o verão pra mais tarde

Controle do vício

Dizem que não existe ex-alcoólatra. Que o alcoolismo é uma doença crônica, que tem controle, mas não tem cura e que alguém que já bebeu, poderá voltar a beber um garrafão atrás do outro se ceder à tentação de uma dosesinha que seja. Dizem também que uma das formas mais seguras de controlar o alcoolismo é não projetar expectativas longas demais. Você vai a uma reunião dos Alcoólicos Anônimos, troca experiências com gente com problemas parecidos e jura por Deus, por si mesmo e pelos seus filhinhos que não irá beber só por aquele dia, ou só até a hora do almoço, ou só até aquela reunião acabar. Findo o prazo projetado, você se sente vencedor, aumenta sua auto-estima e ganha o direito de projetar um novo prazo. “Agora, eu não vou beber até as quatro da tarde; até as oito da noite; até amanhã...”

Pois bem. Ontem, eu não telefonei pra você. Nem escrevi, nem mandei mensagem, nem deixei recado, nem nada. Não tinha projetado um prazo tão ambicioso. A intenção inicial era não ligar até que você ligasse, mas eu me conheço. Aí, prometi não me comunicar só até a hora do almoço, até as sete da noite, até chegar em casa, até a hora de ir dormir... e, graças ao bom Deus, de repente amanheceu.

Hoje é um novo dia. Já são quase nove e meia da manhã e, adivinha só? Eu não liguei pra você! Nem escrevi, nem mandei mensagem, nem nada. Você não está orgulhoso? Eu estou. E vou usar toda a minha força de vontade para me manter sóbria. Eu não vou escrever pra você. Nem telefonar, nem mandar mensagem, nem nada. E sabe por quê? Porque eu cansei de dar murro em ponta de faca.

Meu nome é Ana Téjo e eu estou há um dia, nove horas e trinta minutos sem ligar.

terça-feira, 20 de março de 2007

Parabéns pra quem?

Quando um filho sobrevive à primeira infância, às quedas, às gripes, às dores de barriga e às mordidas dos coleguinhas na escola, quem merece os parabéns? O filho ou a mãe?

terça-feira, 13 de março de 2007

Mania de sucção

Meu filho chupa o dedo desde que nasceu. Na verdade, chupava antes até de nascer porque tenho imagens dele chupando o dedo na barriga, numa ultrassonografia. Quando era recém nascido e não tinha coordenação motora suficiente para chupar o dedo, chupava a mão. Vivia com a mão roxa. Com o passar dos meses, melhorou a coordenação e a pontaria e não largou mais. Preocupada com o desenvolvimento da arcada dentária e com a fortuna que acabaria gastando em aparelhos ortodônticos, comprei praticamente todas as marcas de chupeta do mercado. Da mais vagabunda, de látex, como as que sua avó usava, às mais sofisticadas, ortodônticas, ergonômicas, siliconadas e fluorescentes. Em vão. Falei com a dentista e vi os olhos dela brilharem enquanto dizia que não havia nada pior que o dedo para uma criança chupar.

O dedo, disse ela, estraga a arcada para sempre. Os danos são irreversíveis. Pensei com meus botões que se fossem tão irreversíveis assim, a humanidade já estaria extinta (ou banguela).

O fato é que ele chupa o dedo até hoje, para horror dos amigos puristas. Tem até calo e a unha mais fina, por causa da umidade. E tem que ser o polegar da mão direita. Qualquer outro não serve.

_ Você TEM que fazer seu filho parar com isso, Ana.
_ Ele NÃO TEM mais idade para chupar o dedo.
_ Ah, é? Então vem fazer parar _ penso eu.

Se fosse chupeta, eu poderia negociar, chantagear ou fazer um escambo com algum objeto de desejo, mas o dedo, só se mandar amputar.

Mas o que realmente importa é que as crianças gostam da sensação de aconchego que o ato de sugar proporciona. Como dizem os entendidos, a sucção remete à amamentação e ao calor materno. E isso, pelo jeito, não passa com a idade. Não, eu não chupo o dedo, antes que alguém pergunte. Mas também gosto de colo.

segunda-feira, 12 de março de 2007

Volta

Sete meses e doze dias de um jejum quase absoluto. Digo quase porque preciso confessar que andei escrevendo uma linha aqui e outra acolá para um portal carioca. Coisa de comida, como sempre. Mas coisa eventual, uma vez por semana, no máximo. Fora isso, nada. Até e-mails de pessoas queridas ficaram sem resposta. Sumi mesmo. Fugi, escapei, desisti, sei lá.

Ficou a lição de que o vírus do escritor compulsivo pode ter controle, mas não tem cura e a prova de que sou capaz de exercícios hercúleos de desapego. A constatação da capacidade, de certa forma, alimenta o ego. Por outro lado, de que adianta alimentar um ego triste, vazio de sentido?

Por essas e por outras, voltei. Pensatriz é uma volta, uma tentativa de reencontro com algo que sempre me deu imenso prazer, uma tentativa de reencontro (e reconciliação) com os leitores perdidos e – por que não? – uma busca por pessoas novas que, eventualmente gostarão e voltarão.

A vida é mesmo assim: cheia de ciclos, cheia de idas e vindas. Aqui, inicia-se mais um.
Sejam bem vindos.