quarta-feira, 27 de junho de 2007

Vai chamar seu pai, vai...

Aí, eu chego ao cliente e depois de esperar os quinze minutos protocolares, sou levada por uma mocinha uniformizada até a sala de reuniões, batizada com o nome de um dos produtos da empresa. Mais cinco minutos de espera e entra um rapaz de não parece ter mais de quinze anos.

_ Boa tarde.
_ Oi.
_ Você que é a Ana Tejo?
_ Eu mesma. Acho que tenho uma reunião marcada com o seu pai às quatro horas.
_ Com quem é a sua reunião?
_ Com o Fulano de Tal, gerente de marketing.
_ Ah, sou eu mesmo. Oi, Ana.

Fiquei ali, olhando aquele menino recém saído da adolescência, que ainda tinha espinhas no rosto e pensando nas conseqüências de ter cada vez mais gente como ele em cargos executivos. O fenômeno já tem até nome: juniorização.

A adoção de conceitos como “downsizing” e “reengenharia”, que infestaram o mundo empresarial no início desta década, abriu espaço para a substituição de profissionais mais experientes e bem remunerados por gente mais jovem, ganhando menos e com menos – ou nenhum – benefício.

Se por um lado a empresa reduz instantaneamente seus custos e injeta “sangue novo” em suas operações, por outro perde. E muito. Perde memória, perde vivência e corre o sério risco de colocar em posições estratégicas profissionais verdes, passíveis de tomar decisões erradas, não por incompetência, mas por pura falta de experiência.

Nitidamente, as empresas andam optando pelo que os míopes chamam de “garra”, em detrimento da qualidade. Um júnior é um profissional que muitas vezes ainda mora com os pais, tem poucas despesas fixas, raramente tem filhos e tem toda a disponibilidade do mundo para trabalhar 14 horas por dia, trabalhar nos finais de semana e ainda emendar o final do expediente com uma rodada ou duas num bar próximo, com os colegas de trabalho.

E aí acontecem coisas parecidas com a Visa, que em tempos de despoluição visual de uma cidade como São Paulo, conseguiu uma liminar pra manter um mega outdoor bem ao lado do Shopping Iguatemi. Fico aqui, imaginando o brilho nos olhos do gerente de marketing júnior, dizendo: “Aê! Se demo bem! Sem nenhum outdoor na cidade, o nosso vai chamar muito mais atenção”. Teve também aquela do pessoal do Red Bull (o que te dá aaasas), que resolveu distribuir latinhas do energético nas obras de resgate do desastre do metrô, em São Paulo, como forma de promoção da marca. Bonito, muito bonito. É o que dá... deixar as crianças brincando de escritório sem supervisão.

15 comentários:

Anônimo disse...

Concordo com você sobre o tom destas promoções. Esta do Red Bull é um tanto quanto trágica e diria, imoral.
Aí vem o papo se moralidade tem a ver com idade.
Acho que não. Mas que aprendemos com a maturidade a sermos mais humildes, ah, aprendemos...
Beijos,
vivi

Cláudia disse...

Concordo, a maturidade traz mais humildade, porque afinal de contas a gente aprende com as porcarias que faz ao longo da vida.
Eu sinto na pele este problema quando sou brifada por gente assim, para eventos ou uniformes: é duplamente cansativo lidar com quem toma decisões baseado no "quero, quero grande e quero já", e não no bom senso.
Boa sorte, você vai encontrar com eles muito mais vezes do que eu!
beijo

Anônimo disse...

Ana,

Infelizmente é um caminho sem volta :(

Temos que nos adaptar :)

Estes dias vi um filme assim.

Thales disse...

Tudo bem, mas é fato mesmo que os responsáveis pelo Red Bull e Visa eram gerentes mirins?

Angela disse...

e o pior é qdo um menino desses é gerente do seu banco, e vc ainda em q confiar seu escasso dinheirinho prá um molequinho que mal saiu das fraldas, e não tem nenhuma conta prá pagar, aff

Cláudia disse...

O que eu morro mesmo de medo é um dia cometer um crime e ser julgada por um tribunal presidido por um desses juízes que exercem o Direito a pouco tempo, que tem conhecimento acadêmico suficiente pra passar no dificilimo concurso, mas pouca vivencia, flexibilidade, ponderação e humildade.

em tempo: não to pensando em matar ninguém, apesar de poder fazer aqui rapidinho uma listinha dos possiveis candidatos a presunto!

Anônimo disse...

Daí um dos ditados que adoro: "O diabo não é sábio porque é diabo. É sábio porque é velho.

E, se me permite comentar o comentário da Cláudia, esse receio pela juizada é uma grande verdade. Não só eles como a maioria dos promotores por aí não têm experiência própria de vida nenhuma e, mesmo assim, estão a decidir a vida dos outros. Dia desses a Dona Patroa me falou sobre o comentário de uma mocinha que tinha acabado de passar num concurso pra juíza: "ufa, agora vou poder descansar".

Cruel...

Então (com todo respeito à profissão), que os programas que incentivam essa "garra", como os dos Robertos Justus da vida, que ardam todos no mármore do inferno!

:D

Ana Téjo disse...

Vivi,
Moralidade tem a ver com caráter e não com idade.
Concordo quanto à humildade.

Clau,
Obrigada. Estou sabendo. Deus nos ajude.

Ana Téjo disse...

Cassio,
Eu sei. O pior é que a cada dia, a gente fica mais velho e eles, mais jovens.

Thales,
http://www.estado.com.br/editorias/2007/01/29/eco-1.93.4.20070129.17.1.xml
Vou buscar referências para o case da Visa.

Ana Téjo disse...

Angela,
Ah, se eu tivesse um escasso dinheirinho para confiar a alguém...

Clau,
Eu ia dizer que os juízes não vêm direto pra São Paulo. Eles passam dez ou quinze anos em cidades menores e distantes para ganhar prática e só então ganham o direito de se aproximar na capital. Aí, você só precisaria se preocupar em cometer seu crime aqui mesmo.
Mas o comentário do Adauto derrubou minha tese...

Ana Téjo disse...

Adauto,
Não sou contra incentivar jovens talentos. Sou muito contra, isso sim, a dar a eles um poder que não estão preparados para assumir. É revólver na mão de macaco, entende?

Ana disse...

Ana,
muito bom o seu texto. Concordo que é preciso dar oportunidades aos jovens mas tudo tem limite. Pior ainda é pensar no executivo que foi substituido, que tem familia, muitas vezes está proximo da aposentadoria, e não consegue mais recolocação.
Cruel.
beijos

Ana disse...

Ha, pensei numa coisa: Clau, será que o comercial do Pedrinho tb foi aprovado por um jovem gerente? ;)

Jade disse...

Eu digo a meu patrão que se ganhar na megasena boto uma garotota prá trabalhar aqui e venho prá ficar 2 ou 3 horas por dias só!! hehehehe!!
Não há nada que cubra a vivência e experiência, e isso me estranha muito nun país onde a cada dia a perspectiva de vida é maior...
Beijos!!

Ana Téjo disse...

Ana,
Obrigada.
As oportunidades devem ser dadas, sem dúvida, mas sempre com acompanhamento de gente experiente, que sabe o que está fazendo e que pode ensinar, né?

Jade,
A perspectiva de vida cresce no mundo todo.
Aqui, no Brasil, essa questão da Juniorização está ficando dramática. Azar o nosso, né?