segunda-feira, 2 de abril de 2007

Berreiro

Sábado passado, choveu em São Paulo. Um dilúvio de proporções apocalípticas, do tipo que paralisa aeroportos (se bem que hoje em dia, qualquer garoazinha está paralisando aeroportos), transforma o dia em noite, derruba postes e árvores, alaga marginais e transforma bocas-de-lobo em chafarizes gigantes a céu aberto. Choveu granizo também. Pedras grandes, pesadas, que deixam a gente com a sensação de que não vai sobrar nada do carro. Porque, evidentemente, eu não estava no aconchego do meu lar quando essa tormenta aconteceu. Não! Estava dentro do carro, com filhos, em plena marginal Pinheiros. Mas eu não tenho medo de chuva. Graças ao meu pai e ao meu ex-marido, aprendi todos os truques que um macho viril e destemido precisa saber para se dar bem debaixo d’água e aplico-os sem o menor pudor, sempre que necessário, com resultados altamente satisfatórios.

Lá pelas tantas, meu filho de cinco anos, assustado com o barulho do vento e do granizo na lataria, disse:
_ Puxa! Que berreiro! Papai do Céu está dando um escândalo, não é, mamãe?

Fiquei pensando naquilo. Porque um toró daqueles lembra mesmo uma crise de choro, escandalosa e compulsiva, do tipo que sacode o corpo todo, faz jorrar água dos olhos, faz suar, dá taquicardia e falta de ar, deixa a gente prostrado. Dura um tempo assim, como uma convulsão, para então ir serenando lentamente. Aos poucos, o ar vai voltando, a gente pára de tremer, o suor abranda, o coração se acalma, os olhos secam e os soluços – sempre os últimos a ir embora – vão espaçando. No fim, como na chuva, sobra o alívio da alma lavada. É verdade que fica uma bagunça danada em volta, mas o tempo, o movimento normal das ruas e a própria água se encarregam de limpar tudo.

Eu prefiro assim. Um temporal digno do final dos tempos, que lava tudo de uma vez, derruba o que tem que derrubar e quita a fatura. E não se fala mais nisso.

21 comentários:

MH disse...

Adoro temporais! Claro que prefiro se estiver em casa, mas mesmo tendo ficada ilhada numa padaria, adoro...

aquela garoazinha que nunca pára é de matar... fica um chuvisquinho, que mal molha mas gela a alma, por horas, às vezes dias, a fio. E isso vale pras lágrimas também, claro.

beijo!

Anônimo disse...

Pois é...

Em Santa Izabel, perto de Ajurá, o ceu ficou azul o dia inteiro.

E a noite somente a lua quase cheia.

Anônimo disse...

Também prefiro os temporais intensos e que arrastam tudo o que vê pela frente do que aquela chuvinha chata...incessante...eterna que nos arrasa por mais dias.

Eu, particularmente, estava em casa, há 20 andares do chão, sem luz, sem nada. Eu, comigo mesma, e meu labrador gostoso.
beijos,

Ana Téjo disse...

MH,
Em casa é bem melhor.
E, sim, sem dúvida, temporais rules! Sempre.
Cai duma vez, chove o que tem que chover, seca e pronto.

Cassio,
Nem precisa ir tão longe. Hoje, pela manhã, perguntei pra babá se tinha caído muita água pros lados dela. Ela me olhou espantada e disse: "caiu, não, Don'Ana! Lá pros lados do Campo Limpo não caiu nem uma gota!"
Aqui também, à noite, lua de cinema.

Ana Téjo disse...

Vivi,
Melhor, né?
Não vou dizer que fiquei com inveja da sua casa no vigésimo andar em companhia do seu labrador gostoso, porque inveja não é um sentimento nobre para uma loira bondosa como essa que vos escreve!

Anônimo disse...

Errr... estamos realmente falando das condições climáticas ou da sua vida pessoal?...

Anônimo disse...

Ana, só ontem vi seu e mail que vc estava com essa casinha nova! Que delícia! Já li tudinho. Adoro os seus posts, principalmente o que vc conta dos seus filhos. E mesmo seus posts mais tristes conseguem ser bons...
beijos!

mc disse...

Eu estava no aconchego do lar, com amigos queridíssimos!
Mas concordo. Se vai chover, que seja pra lavar tudo!

Ana Téjo disse...

Adauto,
Qual você prefere?

Greice,
Oba! Que bom que você apareceu. Obrigada e seja muito bem vinda. Virão posts de filhos aos montes (os posts, naturalmente. Porque os filhos, bastam os que eu já tenho). Só preciso, como disse a MC, "digerir" essa fase.

Ana Téjo disse...

MC,
Eu sei. Aliás, como VOCÊ está? Você não acha que já é muito grande pra ficar fazendo a gente passar nervoso, hein? hein? Preciso ir lá, te ler.

Cláudia disse...

Ana, eu estava internada no colégio da minha filha, assistindo aos jogos de vôlei dela, e só pensando que eu tinha deixado a varanda da sala TOTALMENTE ESCANCARADA por causa do calor e do climatempo, que disse que as chances de chuva eram de 0% no sábado.
Cheguei em casa, tudo ensopado... mas nada irrecuperável, como de resto são nossos corações: recuperáveis, felizmente.
beijinhos

Ana disse...

Tb prefiro. Garoa fina, sempre, é pior, tanto em clima quanto no coração.
Beijos

Renata Marques disse...

Como eu já disse aqui, http://3yadda.blogspot.com/2006/03/
pingos-de-saudade.html
,chuva sempre me traz sentimentos bons e/ou saudosos. Adoro! Tenho vontade de ser criança de novo pra comer bolinhos de chuva e assistir sessão da tarde com meus irmãos e minha mãe...

Bjo.

Ana Téjo disse...

Clau,
Nunca confie na Josélia Pegorin.
Na varanda, deve ter dado pra passar um paninho, colocar as almofadas das cadeiras para secar...
No coração também passa. Demora um pouquinho mais pra secar, mas passa.

Ana,
Nem me fale e garoa fina. Do tipo que "chove e não molha, né?" Deus me livre!

Ana Téjo disse...

Rê,
Eu lembro desse post!!! Lembro até que escrevemos coisas parecidas no mesmo dia, não foi? Lindo!

Anônimo disse...

Ana,
Tb prefiro chuva que lava tudo de uma vez, mas tudo com moderação... pois às vezes esses temporais causam enchentes que levam embora algumas coisas, dão perda total em outras, acabam deixando marcas nas paredes que não saem nunca mais, e então sempre que vc for tentar "vender a casa" os candidatos irão perceber aquelas tristes marcas, que nem sempre são bons argumentos de "venda".

Agora falando realmente em condições climáticas, acho muito válida essa comparação com um berreiro! Papai do céu deve mesmo estar "abrindo um berreiro" para demonstrar sua tristeza com o que nós temos feito com nosso planeta.

Quanto tempo será que a humanidade vai demorar para aprender que precisamos levar mais a sério o cuidado com a natureza e com o planeta em geral?

Beijo,
*Anna*

Ana Téjo disse...

*Anna*,
Acho que todo temporal marca, de uma forma ou de outra. Viver também é sobreviver aos temporais. A parte boa é pensar que se aquela casa já enfrentou tantos temporais e continua lá, em pé, altiva, é porque deve ter algum valor, né?
Gostei muito do seu comentário. E gostei do comentário do meu filho também (tanto, que virou posto). Achei tão sensível o paralelo com o berreiro...

mc disse...

Ana, querida
estou ótema! Talvez seu informante não tenha dito que NÃO É NADA GRAVE e que desse mal, eu não morro!
Mas vai render boas histórias...
Don't worry.
beijos

Anônimo disse...

E sabe que parei para refletir qtos temporais já passei???
Nossa!!!Muitos deixou tudo, mas tudo alagado...mas como disse querida Cláudia...nada irrecuperável!!
E hj vivo, na maioria, só uma leve chuvinha...só pra refrescar....

beijos

Mary

Ana Téjo disse...

MC,
Afff! Mas pára, tá? Agora chega disso, combinado? Vamos brincar de outra coisa.

Mary,
Temporais são lições de vida, né?

Anônimo disse...

Como são....

beijos